hoje eu resolvi falar com você, meu caro felipe. o rio de janeiro já não é mais o mesmo e aquele apartamento velho e sujo que você dividia com sua irmã já não existe mais. o jeito agora é girar o globo, apontar o dedo indicador para ele, e pará-lo com a escolha de uma viagem casual, como se fossemos hollywoodianos, assim, bem pouco documentais, bem pouco poéticos. já não importa mais para onde vamos (nós chegamos sempre aonde não sabemos). as impressões se confundem: buenos aires que é sevilla que é recife que é são paulo que é los angeles que é florianópolis que não é nada. meu amigo, os nossos passos são guiados pela bússula musical de uma gaita nervosa, a tua de lá a minha daqui. e os passos também se confundem (ou se misturam, quem sabe?). eu poderia dizer: “vamos transar mais um passeio por londres?”, mas seria por demais anacrônico. o mundo agora é outro, o mundo agora não transa mais nada. a gente faz e desfaz um rodopio sem lugar, sem eixo: em branco. e o branco aqui é outro: não queremos o preto no branco. queremos o branco manchado pela poeira da memória que responde a todas as nossas questões: da bebedeira safada de nosso velho predileto aos rastros sem-dono do nosso jovem mais covarde. tudo é poeira, tudo é nada, felipe. por isso hoje eu resolvi falar com você.
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renata gomes
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